Justiça paulista condena acusado de atear fogo em monumento que homenageia Borba Gato
Estátua do bandeirante Borba Gato antes e depois do incêndio de 2021.
A 5ª Vara Criminal Central de São Paulo condenou, nesta sexta-feira (16), um homem acusado pelo crime de incêndio na estátua de Borba Gato, localizada na zona sul, em julho de 2021. A pena foi fixada em três anos, um mês e 15 dias de reclusão em regime aberto, substituída por pena restritiva de direitos e prestação de serviços à comunidade. De acordo com a decisão, passível de recurso, o réu utilizou pneus e galões de gasolina para incendiar o monumento. A ação não deixou vítimas nem causou danos à estrutura. Em juízo, o acusado assumiu ter ateado fogo na estátua como forma de protesto.
Em sua sentença, o juiz Eduardo Pereira Santos Junior afirmou que a conduta do acusado extrapolou seu direito de expressão e de livre associação para incorrer na seara criminosa, causando incêndio de enorme proporção, que poderia ter atingido posto de gasolina. “A conduta efetivamente colocou em risco não só o patrimônio alheio, mas a vida das pessoas que se encontravam na região”, escreveu o magistrado. E completou: “Não é se ateando fogo em pneus em monumentos ou via pública que se legitimará o debate público sobre personagens históricos controversos. Existem os caminhos legais, por mais tortuosos que possam parecer. É assim que se vive em um Estado democrático de direito”.
Outros dois homens também eram acusados e foram absolvidos. De acordo com a decisão, um deles foi contratado por plataforma on-line para transporte de pneus usados e não sabia do incêndio. O outro acreditava que apenas participaria de um protesto na região.
O monumento, símbolo de orgulho e de vergonha
Situada no encontro das avenidas Santo Amaro e Adolfo Pinheiro, no bairro de Santo Amaro, zona sul da capital paulista, a estátua de Borba Gato foi inaugurada em 27 de janeiro de 1963. O monumento foi concebido pelo escultor Julio Guerra (1912-2001) para as comemorações do IV Centenário de Santo Amaro, município que passou a ser bairro da cidade de São Paulo em 1932. Guerra morava na região e era apaixonado pela história antiga da ex-cidade. O monumento de 10 metros de altura, com um pedestal de granito de 2 metros, tem suas vestes e corpo repleto de pedrinhas coloridas de basalto. Por dentro, é sustentado por antigos trilhos de bondes retirados da avenida Santo Amaro. O monumento era, então, símbolo de orgulho, já que o bandeirante Borba Gato era filho da cidade surgida em 1563.
Em 2020, quando a morte de George Floyd provocou manifestações antirracistas e envolveu a derrubada de uma série de monumentos no mundo todo, o Borba Gato foi considerado um dos monumentos mais ameaçados. por representar o modo como os bandeirantes desbravaram o interior do país, capturando, escravizando e matando indígenas e quilombolas.
No dia 24 de julho de 2021, enquanto na av. Paulista ocorria mais uma manifestação contra o governo Bolsonaro, um grupo intitulado ‘Revolução Periférica’ se manifestou de outro modo. Eles fecharam a avenida Santo Amaro, cercaram o monumento e colocaram pneus no pedestal. Atearam fogo na estátua e estenderam uma bandeira/legenda da ação com os dizeres: ‘Revolução Periférica: a favela vai descer e não vai ser Carnaval’.
Quem escreveu
Escritor e jornalista formado pela Universidade de São Paulo, com passagem pelo Diário Comércio e Indústria, pela Revista dos Tribunais, pela Editora Abril e diversos outros órgãos de imprensa, com especialização em extensão rural e jornalismo científico.
