3 de maio de 2024

Zé Celso deixa o palco da vida aos 86 anos, mas seu legado vai influenciar as futuras gerações

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O diretor teatral e dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, 86, foi internado no Hospital das Clínicas, em São Paulo, nesta terça-feira (4), após um incêndio atingir o apartamento no bairro Paraíso, na zona sul da capital paulista. Foto: José Celso Martinez/Instagram

Morreu na manhã desta quinta-feira (6) o ator e dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, conhecido como Zé Celso. Ele tinha 87 anos e estava internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital das Clínicas, na capital paulista, desde terça-feira (4) após um incêndio ter atingido o apartamento em que morava. O fundador do Teatro Oficina teve 53% do corpo queimado, além de inalar fumaça.

Em suas redes sociais o Teatro Oficina Uzyna Uzona confirmou a morte de Zé Celso com a citação “Tudo é tempo e contra-tempo! E o tempo é eterno. Eu sou uma forma vitoriosa do tempo” e dizendo que “nossa fênix acaba de partir para a morada do sol”.

Legado

O mais longevo dramaturgo em atividade, Zé Celso Martinez, que morreu nesta quinta-feira (6), deixa o legado de uma arte que revolucionou a política e os costumes. Ele encarou a ditadura militar e foi perseguido por suas montagens dionisíacas. Zé Celso foi preso, torturado e exilado, e produziu documentários sobre as revoluções portuguesa e moçambicana. O documentário Zé Celso: tupy or not tupy lembra que ele trabalhou com grandes nomes das artes, como Augusto Boal, Chico Buarque, Sérgio Britto, Raul Cortez e Pascoal da Conceição.

José Celso Martinez Corrêa  nasceu em Araraquara no ano de 1937. Em 1955 entrou para o curso da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, profissão que nunca exerceu. Entretanto no período em que esteve no Largo São Francisco formou o Teatro Oficina e foi ali  que seus primeiros textos Vento Forte para Papagaio Subir (1958) e A Incubadeira (1959), foram encenados.

No início da década de 60, ele se profissionaliza, e a sede do grupo é transferida para o teatro da Rua Jaceguai, onde três anos depois Zé Celso dirigia Pequenos Burgueses, de Máximo Gorki, peça de sucesso que ganhou diversos prêmios, mas que foi censurada no ano seguinte, quando o Brasil mergulhou na ditadura militar. Após um incêndio, o teatro da Rua Jaceguai foi reformado e a primeira montagem dessa nova fase foi O Rei da Vela, em 1967, com base num texto escrito por Oswald de Andrade na década de 30, também encenada por Zé Celso.

A partir de 1968, o grupo monta Roda VivaGalileu Galilei e Na selva das cidades. Depois disso, Zé Celso se dedicou ao filme O Rei da Vela e enfrentou um período de crise, sofrendo com a repressão. Em 1974, chegou a ser preso, sendo solto depois de 20 dias, e se exilou em Portugal, onde fez o filme O Parto, por ocasião da Revolução dos Cravos. No ano seguinte, foi a Moçambique, onde filmou a independência do país. Zé Celso voltou para São Paulo em 1978 e retomou o trabalho à frente do Oficina.

Nos anos 80, o ator e diretor fez um intervalo nas produções, mas passou a lutar pela permanência da companhia no local, onde já havia se consolidado, já que, em 1982, o dono do quarteirão onde o imóvel está localizado, o Grupo Silvio Santos, anunciou a construção ali de um shopping center, gerando mobilização dos artistas junto à sociedade civil e autoridades governamentais. O tombamento do espaço cênico do Oficina como patrimônio histórico da cidade de São Paulo contribuiu para a resistência contra os objetivos do grupo.

A partir de 1990, a companhia entra em nova fase com o nome de Companhia de Teatro Oficina Uzyna Uzona, e realiza espetáculos como As bacantes (1996), de Eurípides, e Cacilda! (1998), que relatou a vida da atriz Cacilda Becker segundo a visão de Zé Celso. De 2000 em diante Zé Celso se dedicou a recriar a obra Os sertões, de Euclides da Cunha, publicada em 1902, e fez com que o Oficina fosse palco para assembleias de movimentos artísticos (Arte Contra a Barbárie) e sociais (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST).

O diretor trouxe ainda a construção e desconstrução do Arraial de Canudos (BA), tombado pela guerra de 1897, embate do Exército com os sertanejos liderados por Antônio Conselheiro. Fazem parte dessa epopeia musical A terra (2002), O homem – parte 1 – do pré-homem à re-volta (2003), O homem – parte 2 – da re-volta ao trans-homem (2003), A luta – parte 1 (2005) e A luta – parte 2 (2006), sempre com cerca de 50 artistas em cena, entre músicos, o núcleo de atores e as crianças e adolescentes do projeto comunitário Bexigão, referência ao bairro do Bexiga, onde fica o Oficina.

Uma das características dos espetáculos de Zé Celso é a encenação para o grande público, de graça, ao ar livre ou em grandes espaços. Um exemplo desse formato é As Dionisíacas, conjunto de quatro peças que percorreu sete capitais ao longo de 2010. As apresentações ocorriam sempre em estádios, com entrada franca.

Zé Celso e os livros

Em um texto para a Plublishnews, Guilherme Sobota escreveu: Artista da palavra e dramaturgo fundamental da cultura brasileira, Zé Celso priorizou o palco para veicular sua literatura. Em razão disso, muito da produção do mercado editorial brasileiro ao redor do seu nome se concentra em livros com reuniões de entrevistas (geralmente brilhantes e totalmente fora do comum), artigos sobre a produção do Teatro Oficina – sua principal criação – e traduções de sua autoria. Entre elas, estão Heliogabalo ou O anarquista coroado e Para dar um fim no juízo e deus (N-1 Edições), de Antonin Artaud, dramaturgo e poeta francês cujas peças foram encenadas pelo Teatro Oficina ao longo dos anos. Em 1998, a Editora 34 lançou Primeiro ato: cadernos, depoimentos, entrevistas (1958-1974), com textos de Zé Celso e organização de Ana Helena Camargo de Staal, considerado até hoje um dos principais documentos da fase inicial do Oficina. Em 2008, a Azougue Editorial publicou Encontros: Zé Celso Martinez Correa, com organização de Karina Lopes e Sergio Cohn, volume inédito de suas entrevistas com um olhar amplo sobre sua vida e obra. Em uma entrevista ao Estadão, em julho de 2020, durante o isolamento imposto pela pandemia, Zé Celso disse que estava escrevendo um livro sobre a história do Oficina. “É sobre a origem da nossa tragicomédia-orgia do Oficina. Enquanto Nietzsche se inspirou na ópera – ele adorava a Carmen, de Bizet – vou me inspirar nos batuques e no candomblé. Para mim, música não é espírito. É corpo”, disse na ocasião.

(*) Com informações da Agência Brasil

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